quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

CALOR EMITIDO POR CIDADES PODE ALTERAR PADRÕES CLIMÁTICOS.



Novo estudo publicado na Nature Climate Change revela que ilhas de calor urbano não apenas modificam a temperatura das cidades e seus arredores, mas também podem influenciar sistemas climáticos a milhares de quilômetros de distância

As ilhas de calor urbano (ICUs) são um fenômeno já bem conhecido pelos cientistas climáticos: as alterações na paisagem natural, bem como as atividades humanas, fazem com que mais calor seja produzido nas cidades, o que pode fazer com que a região seja até 5ºC mais quente do que as áreas mais distantes do perímetro urbano.

No entanto, uma nova pesquisa realizada por uma equipe da Instituição Scripps de Oceanografia e do Centro Nacional para Pesquisa Atmosférica dos Estados Unidos revelou que esse calor gerado nas cidades não afeta apenas a temperatura do perímetro urbano e suas proximidades, mas pode alterar sistemas climáticos a milhares de quilômetros de distância e em diferentes épocas.

Segundo a análise, publicada neste domingo no periódico Nature Climate Change, as mudanças causadas pelo calor gerado em áreas urbanas do Hemisfério Norte pode levar a até 1ºC de aquecimento no inverno.

Para chegar a essa conclusão, Guang Zhang, líder do estudo, e seus colegas analisaram o consumo de energia que gera o calor liberado no perímetro urbano. Em 2006, o consumo mundial de energia foi de 16 terawatts (16 trilhões de watts). Destes, 6,7 TW foram consumidos em 86 áreas metropolitanas no Hemisfério Norte.

Avaliando os padrões de consumo de energia por computador, eles calcularam que o calor emitido seria suficiente para modificar as correntes de ar e para tornar algumas regiões notavelmente mais quentes. No geral, essas mudanças têm um efeito leve, mas perceptível, nas temperaturas mundiais, aumentando-as em média em 0,1ºC.

“O que descobrimos é que o uso de energia de diversas áreas urbanas coletivamente pode aquecer a atmosfera remotamente, a milhares de quilometros de distância das regiões de consumo de energia. Isso é realizado através de mudanças na circulação atmosférica”, comentou Zhang.

De acordo com os cientistas, esse fenômeno é diferente das ICUs porque afeta as correntes de ar e fortalece os fluxos atmosféricos nas latitudes médias, enquanto as ICUs se concentram nas proximidades das cidades.

Apesar de não estabelecer o quanto esse fenômeno contribui na aceleração do aquecimento global, os autores declararam que o efeito do aquecimento urbano colabora para a diferença entre a elevação das temperaturas observada na prática e o aquecimento de inverno simulado por modelos usados pela ciência para análise e previsão do clima.

Por isso, os pesquisadores sugerem que a influência do consumo de energia também seja usada, assim como a emissão de gases do efeito estufa e de aerossóis, como uma variável dos modelos climáticos de computador.

“Uma estimativa melhor e mais precisa do uso global de energia baseada em informação de cidade a cidade deve ser desenvolvida para dar conta plenamente do impacto climático devido ao consumo de energia nas futuras projeções de mudanças climáticas”, concluíram.

Fonte: Instituto CarbonoBrasil

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

É O CO2, DILMA !!!



“Nosso parque térmico, que utiliza gás, diesel, carvão e biomassa foi concebido com a capacidade de compensar os períodos de nível baixo de água nos reservatórios das hidrelétricas. Praticamente todos os anos as térmicas são acionadas, com menor ou maior exigência, e garantem, com tranquilidade, o suprimento. Isso é usual, normal, seguro e correto. Não há maiores riscos ou inquietações.” (ROUSSEFF, D., 2013, em pronunciamento público)

Errado, presidenta! Utilizar combustíveis fósseis não pode ser considerado “normal”, “seguro”, nem “correto”. Cada molécula extra de CO2 adicionada à atmosfera, elevando a já insegura concentração de 394 ppm amplia o “risco” climático e deveria, da parte de qualquer governante sensato deste mundo, despertar “inquietação”.

Claro, é fundamental colocarmos em contexto. Em 2001, o Brasil foi surpreendido por uma crise energética que veio a ficar conhecida como “Crise do Apagão”. No final do ano anterior, isto é, em 2000, a situação dos reservatórios hidrelétricos, principal fonte de geração elétrica no País, era precária. Foi adotado um racionamento de energia, medida típica de uma condição não apenas emergencial, mas que denunciava falta de planejamento e irresponsabilidade histórica. Havia ficado claro que a falta de investimento no setor, parte da política de privatização da era FHC, havia deixado o Brasil em situação bastante vulnerável.

No entanto, a “saída” emergencial de FHC e que posteriormente proliferou nos governos petistas foi a pior possível: a combinação do incentivo às termelétricas a óleo diesel, carvão e gás natural com a retomada dos projetos dos tempos dos militares, de grandes hidrelétricas na Amazônia (estas últimas tem custo sócio-ambiental enorme, sendo que um bom resumo das críticas de especialistas particularmente a Belo Monte é apresentada pelo Portal Ecodebate, num artigo em que há links para os documentos completos que foram elaborados, mas não serão o nosso foco neste texto). O que é realmente constrangedor é que o Brasil esteja retroagindo várias décadas no que diz respeito à composição de sua matriz energética, com o aumento substancial do uso de combustíveis fósseis!

decreto que criou o chamado “Programa Prioritário de Termeletricidade”, foi assinado por FHC, no início de 2000. É absolutamente sucinto e não faz nenhuma menção à questão das emissões. 13 anos depois (simbólico, o número), Dilma se une a FHC e silencia, da mesma forma, sobre a questão climática. As emissões das térmicas somente em Janeiro podem ultrapassar 5 milhões de toneladas de CO2. O Brasil, que já tem tido dificuldade em cortar emissões de sua principal fonte, o desmatamento, o que deveria ser bem mais fácil, vê agora o crescimento não apenas das emissões de transporte, mas também das do setor energético.

Além do “silêncio climático”, vários outros aspectos têm sido omitidos, em relação ao uso das térmicas. O primeiro deles é que, além do CO2, há outras emissões, incluindo material particulado e óxidos de enxofre, particularmente no caso de térmicas a carvão. Impactos nocivos adicionais sobre o ambiente (incluindo chuva ácida) e a saúde humana se sobrepõem aos danos ao sistema climático. O segundo, é que uma série de insumos são necessários, com destaque para a água. Isso mesmo! Termelétricas precisam ser resfriadas e utilizam quantidades colossais de água dos reservatórios do País. Em alguns casos, como no Estado do Ceará, chega-se ao absurdo de subsidiar a água para as térmicas (no porto do Pecém, uma termelétrica, de propriedade do Sr. Eike Batista, recebe água bruta por metade do preço).

O pronunciamento da Presidenta foi efusivamente saudado por apoiadores. O discurso presidencial, bem como as referências a ele (principalmente pelo anúncio da redução da tarifa, mas esquecendo do contexto geral) foram feitos num tom absolutamente ufanista. É algo estranho quando o que se descreve na frase que citei nada mais é do que o falso êxito de uma saída paliativa, herdada do fiasco de um governo anterior, de facção rival.

A verdade é que é lamentável que a Presidenta, em 2013, quando é necessário e possível que o Brasil assuma um papel de liderança nas negociações climáticas, simplesmente ignore o impacto dessa forma de utilização de energia sobre o clima do planeta. Esqueceu, inclusive de como o clima afeta nossa principal fonte energética, as hidrelétricas, pois os reservatórios hidrelétricos podem ser afetados por mudanças no regime de precipitação (algo sobre o quê há muitas incertezas), pelo aumento de temperatura (este bem estabelecido no contexto do aquecimento global) e pelo consumo (que, diga-se de passagem, inclui uso massivo para refrigeração, que pressiona fortemente o sistema elétrico durante o verão).

Além disso, é também lamentável que as fontes renováveis tenham sido esquecidas em seu discurso e que a possibilidade de se usar energia solar para geração em escala doméstica (o que pode zerar a conta de energia ou até servir como fonte de renda para famílias mais pobres) não esteja sendo considerada pelo Governo Federal, o que representaria um impacto muito mais significativo do que a redução de 18% na tarifa. Para os que repetem o defasado mantra de que a “energia solar é cara”, informo que hoje em dia esta dispensa o uso de baterias (que ocupavam espaço, aumentavam o custo e impunham manutenção) e que essa tecnologia já é acessível, vide a iniciativa tomada em minha própria instituição. O uso generalizado em prédios públicos, o subsídio para famílias de baixa renda e linhas de crédito para as camadas médias poderiam levar, em questão de poucos anos, a uma participação significativa da energia solar em nossa matriz energética.

O Brasil pode ser, sim, uma grande potência energética, mas sobretudo pode ser um exemplo de como os combustíveis fósseis podem ficar para trás! Se protegermos nossas florestas e zerarmos o desmatamento; se utilizarmos nosso grande potencial solar, eólico, de ondas e maremotriz salvaguardando os reservatórios hidrelétricos; enfim, se recusarmos a exploração do petróleo da camada do pré-sal, o Brasil poderá estar na vanguarda das negociações climáticas, e será reconhecido historicamente pelo seu compromisso com as futuras gerações.

Autor: Alexandre Costa*   -   Fonte: EcoDebate


*Alexandre Costa, Fortaleza, Ceará, Brazil, é Ph.D. em Ciências Atmosféricas, Professor Titular da Universidade Estadual do Ceará.

GOVERNO ALIENADO INCENTIVA CONSUMO DE ENERGIA!



Em pleno século XXI, num país sob os efeitos de uma mudança climática com eventos catastróficos e dificuldades cada vez mais sérias para expandir a geração de energia, é possível que um Ministro de Energia e Minas diga aos cidadãos para usar e abusar da já escassa energia elétrica disponível? Foi isso o que se compreendeu quando Edison Lobão falou alto e claro para “ligar seu ar condicionado”, pois não falta ou faltará energia no Brasil.

Que país é este onde as autoridades constituídas instigam o consumo abusivo de energia? Apesar dos apagões dos últimos meses, a razão para estimular o aumento do consumo é óbvia: está em curso uma decisão do governo de reduzir as tarifas elétricas, algo justificável para o uso industrial, mas não para o doméstico. Parece que o governo pretende criar um colapso.

Não saberão os governantes que parte significativa da energia elétrica se perde ou é mal gasta? Sabem quanto está se perdendo, no futuro, em possibilidades no uso de recursos hídricos limpos, aproveitamento da fauna aquática e possibilidades correlatas de lazer e agricultura? Será que eles têm noção da quantidade de destruição em florestas, terras indígenas e áreas protegidas que deverão alagar para satisfazer esse consumo adicional?

Custos ambientais

Para se construir novas usinas hidroelétricas no rio Tapajós e no Madeira, por exemplo, 9 unidades de conservação foram redelimitadas, diminuídas ou sofreram mudança de categoria. O desenvolvimento a qualquer custo está posto, junto com o desastre ambiental associado. O mais triste: essas decisões talvez sejam decorrência de despreparo científico e técnico dos tomadores de decisão, e não somente corrupção ou má fé. Será que entendem o que falam?

Especialistas em energia me dizem que poderíamos economizar até 15% de energia apenas com um programa de uso adequado, esclarecendo os usuários sobre como não desperdiçar um recurso que escasseia no mundo todo. Na contramão, nossos mandatários querem baixar o preço da energia e estimular o consumo para, assim, construir mais hidroelétricas e termoelétricas.

O custo de uma hidroelétrica pode ultrapassar 22 bilhões de reais. Os brasileiros precisam saber que esta dinheirama sai do seu bolso. Poderia ser muito melhor usada na educação, saúde ou na área ambiental, onde traria mais benefícios sociais sem desalojar índios ou ribeirinhos. Se economizássemos 7% ao ano do gasto energético doméstico, o país liberaria recursos expressivos para poupar e proteger parte da nossa biodiversidade.

Senhor ministro, é verdade que nós ambientalistas gostamos de usar ar-condicionado, mas quando necessário. Saber como e onde usá-lo, eis a questão.

Faço minha pequena contribuição. Na minha casa toalhas e lençóis não são passados e banhos quentes só no inverno. Uso aquecimento solar e captação de água de chuva. Dessa forma, não vivo como uma troglodita. Ao contrário, obtenho os benefícios da tecnologia disponível. Como ambientalista, reduzo a minha pegada ecológica e ensino igual aos meus filhos e netos.

Continuarei a protestar contra escândalos como Balbina ou Belo Monte e todas as demais hidroelétricas que estão destruindo ou barrando os nossos rios.

Como fizeram o ministro e outras autoridades, a apologia ao uso irrestrito da energia é uma afronta ao bom senso e ao desenvolvimento e bem-estar humanos.

Autor: Maria Tereza Pádua*   -   Fonte: O Eco

*Engenheira agrônoma e fundadora da Funatura, membro do Conselho da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza e da comissão mundial de Parques Nacionais da UICN. 

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O MITO DO PROGRESSO HUMANO.



Clive Hamilton em seu "Réquiem por uma Espécie: Por que resistimos à verdade sobre a mudança climática", descreve um alívio sombrio que vem de aceitar que a "catastrófica mudança climática é praticamente certa". Esta obliteração de "falsas esperanças", diz ele, exige um conhecimento intelectual e um conhecimento emocional. O primeiro é atingível. O segundo, por significar que aqueles que amamos, incluindo os nossos filhos, estão quase certamente fadados à miséria, insegurança e sofrimento dentro de poucas décadas, senão de alguns anos, é muito mais difícil de adquirir. Aceitar emocionalmente um desastre iminente, atingir a compreensão visceral que a elite do poder não vai responder de forma racional à devastação do ecossistema, é tão difícil de aceitar como nossa própria mortalidade. A luta existencial mais difícil do nosso tempo é a de ingerir esta terrível verdade - intelectualmente e emocionalmente - e continuar a resistir às forças que estão nos destruindo.

A espécie humana, liderada por europeus e euro americanos brancos, tem sido um alvoroço de 500 anos de conquistas, saques, pilhagens, explorações e poluições da Terra, bem como matando as comunidades indígenas que estavam no caminho. Mas o jogo acabou. As forças técnicas e científicas que criaram uma vida de luxo sem precedentes - bem como inigualável poder militar e econômico - para as elites industriais agora são nossa desgraça. A mania de expansão econômica e de exploração incessante tornou-se uma maldição, uma sentença de morte. Mas assim como nossos sistemas econômicos e ambientais desvendam-se, após o ano mais quente em 48 estados desde que a manutenção de registros começou há 107 anos, não temos a criatividade emocional e intelectual para desligar o motor do capitalismo global. Juntamos-nos a uma máquina do fim do mundo que tritura tudo em seu caminho, como o projeto de relatório do Comitê Consultivo Nacional do Clima e Desenvolvimento ilustra. Ilustração por Mr. Fish.

Civilizações complexas têm o mau hábito de destruírem-se. Antropólogos, incluindo Joseph Tainter em "O Colapso das Sociedades Complexas", Charles L. Redman em "Impacto Humano em Ambientes Antigos" e Ronald Wright, em "Uma Breve História do Progresso" estabeleceram os padrões familiares que levam ao colapso do sistema. A diferença desta vez é que, quando descermos, todo o planeta irá conosco. Não haverá, com este colapso final, novas terras para explorar, nem novas civilizações para conquistar, nem novos povos para subjugar. A longa luta entre a espécie humana e a Terra terminará com os remanescentes da espécie humana aprendendo uma dolorosa lição sobre a ganância desenfreada e a autoadoração.

"Há um padrão no passado da civilização após civilização desgastando suas boas-vindas da natureza, superexplorando seu ambiente, super expandindo-se, super povoando", disse Wright quando fiz contato com ele por telefone em sua casa em British, Columbia, Canadá. "Eles tendem a entrar em colapso pouco depois de chegarem ao seu período de maior esplendor e prosperidade. Esse padrão vale para uma série de sociedades, entre eles os romanos, os antigos maias e os sumérios do que é hoje o sul do Iraque. Há muitos outros exemplos, incluindo sociedades de menor escala como a Ilha de Páscoa. As mesmas coisas que fazem com que as sociedades prosperem no curto prazo, especialmente novas maneiras de explorar o ambiente, tais como a invenção da irrigação, levam ao desastre no longo prazo por causa de complicações imprevistas.

Isto é o que eu chamei de "armadilha do progresso" em "Uma Breve História do Progresso". Temos colocado em movimento uma máquina industrial de tal complexidade e tal dependência em expansão que não sabemos como fazer com menos ou mudar para um estado de equilíbrio em termos de nossas demandas da natureza. Nós temos falhado em controlar o número de humanos. Eles triplicaram durante minha vida. E o problema é muito pior pelo crescente espaço entre ricos e pobres, a concentração de riqueza garante que nunca tem o suficiente para todos. O número de pessoas em extrema pobreza, hoje, é cerca de dois bilhões, maior do que toda a população do mundo no início de 1900. Isso não é progresso”.

"Se continuarmos a não tomar conta das coisas de uma forma ordenada e racional, iremos a algum tipo de catástrofe, mais cedo ou mais tarde", ele disse. "Se tivermos sorte, será grande o suficiente para nos despertar em todo o mundo, mas não grande o suficiente para nos eliminar. Isso é o melhor que podemos esperar. Devemos transcender a nossa história evolutiva. Nós somos caçadores da Idade do Gelo, de barba feita e vestindo um terno. Nós não somos bons pensadores para longo prazo. Nós gostaríamos de desfiladeiro sim nos de mamutes mortos conduzindo um rebanho de um penhasco que descobrir como conservar o rebanho para que ele possa alimentar a nós e aos nossos filhos para sempre. Isto é a transição que nossa civilização tem que fazer. E nós não estamos fazendo isso."

Wright, que em seu romance "Um Romance Científico" pinta um retrato de um mundo futuro devastado pela estupidez humana, cita "arraigados interesses políticos e econômicos" e uma falha da imaginação humana, como os dois maiores obstáculos à mudança radical. E todos nós, que usamos combustíveis fósseis, que nos sustentamos através da economia formal, diz ele, estamos em Sociedades capitalistas modernas, Wright argumenta em seu livro "O que é a América?: Uma Breve História da Nova Ordem Mundial", derivam de invasores Europeus, a pilhagem das culturas indígenas das Américas do 16 ao século 19, juntamente com o uso de escravos africanos como uma força de trabalho para substituir os nativos.

Os números desses nativos caíram mais de 90% por causa da varíola e outras pragas que não existiam antes. Os espanhóis não conquistaram nenhuma das principais sociedades até a varíola os atingir; de fato, os astecas os venceram de primeira. Se a Europa não foi capaz de aproveitar o ouro das civilizações asteca e inca, se não tivesse sido capaz de ocupar a terra e adotar culturas altamente produtivas do Novo Mundo para uso em explorações agrícolas europeias, o crescimento da sociedade industrial na Europa teria sido muito mais lento. Karl Marx e Adam Smith chamaram atenção para o fluxo de riqueza das Américas como tendo feito a Revolução Industrial e possível o início do capitalismo moderno. Foi o estupro das Américas, ressalta Wright, que acionou a orgia de expansão europeia. A Revolução Industrial também equipou os europeus com sistemas de armas tecnologicamente avançados, criando mais subjugação e pilhagem, tornando a expansão possível.

"A experiência de 500 anos relativamente fáceis de expansão e colonização, a constante assunção de novas terras, levou ao mito capitalista moderno que você pode expandir para sempre", disse Wright. "É um mito absurdo. Nós vivemos neste planeta. Nós não podemos deixá-lo e ir para outro lugar. Temos que trazer nossas economias e demandas da natureza dentro dos limites naturais, mas nós tivemos 500 anos em que os europeus, euro americanos e outros colonos invadiram o mundo e o dominaram. Esta execução de 500 anos fez com que a situação parecesse não só fácil, como normal. Nós acreditamos que as coisas vão sempre ficar maior e melhor. Temos que entender que este longo período de expansão e prosperidade era uma anomalia. Ele raramente aconteceu na história e nunca vai acontecer de novo. Temos que reajustar nossa civilização inteira para viver em um mundo finito. Mas nós não estamos fazendo isso, porque nós estamos carregando bagagem demais, versões míticas demais da história deliberadamente distorcidas e um sentimento profundamente arraigado de que ser moderno é ter mais. Isto é o que os antropólogos chamam uma patologia ideológica, uma crença autodestrutiva que leva sociedades a se destruírem e queimarem. Estas sociedades continuam fazendo coisas que são realmente estúpidas, porque elas não podem mudar sua maneira de pensar. E é aí que nós estamos".

E, enquanto o colapso se torna palpável, se a história humana é um guia, nós como sociedades passadas em perigo vamos recuar em que os antropólogos chamam de "cultos de crise." A impotência que sentiremos do caos ecológico e econômico irá desencadear delírios mais coletivos, como a crença fundamentalista em um deus ou deuses que vão voltar à Terra e nos salvar.

"Sociedades em colapso muitas vezes acreditam que se certos rituais são realizados todas as coisas ruins vão embora", disse Wright. "Há muitos exemplos disso ao longo da história. No passado, estes cultos de crise aconteceram entre as pessoas que haviam sido colonizadas, atacadas e mortas por pessoas de fora, que perderam o controle de suas vidas. Eles veem nesses rituais a capacidade de trazer de volta o mundo passado, o que enxergam como uma espécie de paraíso. Eles procuram voltar ao modo de como as coisas eram. Cultos de crise espalharam-se rapidamente entre as sociedades americanas nativas no século 19, quando os búfalos e os índios estavam sendo mortos, por fuzis e pistolas, armas de fogo. As pessoas passaram a acreditar, como aconteceu no Ghost Dance, que se fizessem as coisas certas, o mundo moderno, que era intolerável, - o arame farpado, as ferrovias, o homem branco, a metralhadora - desapareceria".

"Nós todos temos a mesma fiação psicológica básica", disse Wright. "Isso nos faz muito mal em planejamento de longo prazo e nos leva a apegar-nos a ilusões irracionais, quando confrontado com uma ameaça séria. Olhe para a crença da extrema direita de que se o governo desaparecesse, o paraíso perdido da década de 1950 iria voltar. Olhe para a forma de como estamos deixando a exploração de petróleo e gás seguir em frente, quando sabemos que a expansão da economia do carbono é suicida para os nossos filhos e netos. Os resultados já podem ser sentidos. Quando se chega ao ponto onde grande parte da Terra experimenta quebra de safra ao mesmo tempo, teremos fome e colapsos em massa. Isso é o que está por vir se não lidarmos com as mudanças climáticas.”

"Se falharmos neste grande experimento, esta experiência de macacos se tornarem inteligentes o suficiente para assumir o comando do seu próprio destino, a natureza não se importará e dirá que foi divertido por um tempo deixar os macacos executar o laboratório, mas no final foi uma má ideia”, disse Wright.


Autor: Chris Hedges*   -   Fonte: Carta Maior

(*) Chris Hedges é colunista para Truthdig.com. Hedge se formou em Harvard Divinity School e foi durante quase duas décadas correspondente estrangeiro para o New York Times. Ele é o autor de muitos livros, incluindo: A Guerra É Aquela Força Que Nos Dá Sentido, O Que Todos Deveriam Saber Sobre Guerra, e Fascistas Americanos: A Direita Cristã e a Guerra na América. Seu livro mais recente é Império da Ilusão.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

NASA E NOAA INDICAM 2012 COMO UM DOS DEZ ANOS MAIS QUENTES.


A temperatura média do ano passado ficou 0,57°C acima da média do século XX, as agências alertam ainda que o aquecimento global está se acelerando e que a partir de agora cada década será mais quente do que a anterior

Análise das temperaturas globais desde 1880 / NASA

As duas principais agências norte-americanas de monitoramento climático, a NASA e a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA), divulgaram nesta terça-feira (15) suas análises de 2012 e informaram que trata-se de um dos dez anos mais quentes já registrados.

Já havia sido apontado que o ano passado foi o mais quente da história dos Estados Unidos, e agora, as agências afirmam que globalmente a temperatura média de 2012 ficou 0,57°C acima da média do século XX.  

Segundo a NOAA, isso faz de 2012 o décimo ano mais quente já registrado. Para a NASA, foi o nono mais quente.

“Um ano a mais de números não é em si mesmo significante. O que importa é que a década como um todo foi mais quente do que a anterior, e a anterior foi mais quente do que a que veio antes. O planeta está aquecendo”, afirmou Gavin Schmidt, climatologista da NASA.

O ano de 2012 foi o 36o consecutivo com temperaturas acima da média. O recorde de marca de máximo de aquecimento está com 2010, que apresentou uma anomalia de 0,66°C. Os 12 anos do século XXI estão todos entre os 14 mais quentes já registrados.

Para os oceanos, a temperatura média ficou 0,45°C acima da média histórica. Isso mesmo levando em conta que 2012 foi marcado pelo fenômeno La Niña, que esfria a temperatura das águas. 

De acordo com a NOAA, há indícios de que o aquecimento do planeta está se acelerando. A partir de 1880, cada década apresentou uma elevação de 0,06°C nas temperaturas anuais. Esse valor subiu para 0,16°C após 1970.

A NASA destaca o fator da concentração dos níveis de dióxido de carbono na atmosfera como o grande diferencial. “Em 1880 a concentração era de 285 partes por milhão (ppm), em 1960 já era de 315ppm e atualmente está em 390ppm”, aponta o comunicado da agência.


Extremos

A NOAA fez uma lista dos dez principais eventos climáticos extremos ocorridos em 2012, sendo que a seca no Nordeste brasileiro aparece em oitavo lugar.

O mais marcante de todos os fenômenos, segundo a NOAA, foi o recorde de menor extensão do gelomarinho do Ártico. No dia 16 de setembro, imagens de satélite do Centro Nacional de Dados de Neve e Gelo (NSIDC) dos Estados Unidos mostraram que a capa de gelo ficou com 3,42 milhões de km2. 

Em segundo aparece a seca no verão que afetou importantes regiões agrícolas mundiais, causando a elevação nos preços dos alimentos. Produtores na Rússia, Ucrânia e Estados Unidos estão entre os que mais sofreram. 

A super tempestade Sandy ficou com o terceiro lugar. Causando 185 mortes pelos países nos quais passou e bilhões em prejuízos, o fenômeno teria ganho uma força descomunal graças ao aquecimento acima da média das águas do Oceano Atlântico. 

A falta de chuva em 2012 no Brasil causou a pior seca em cinco décadas, afetando cerca de quatro milhões de pessoas. O suprimento de água foi prejudicado em mais de mil municípios e a geração energética brasileira, altamente dependente das hidroelétricas, deve continuar comprometida pelos próximos meses.

“Algumas temporadas ainda serão mais frias do que a média, mas percebemos que a frequência de extremos de calor está crescendo. São esses extremos que mais impactam nas pessoas e na vida no planeta”, concluiu James Hansen, diretor do Instituto Goddard para Estudos Espaciais da NASA.

 Autor: Fabiano Ávila   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

CORTAR EMISSÕES REDUZIRIA ATÉ 65% AS CONSEQUÊNCIAS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.


Primeiro estudo a avaliar profundamente os benefícios de limitar as emissões de gases do efeito estufa afirma que a produção de alimentos estaria entre as áreas que mais sairiam ganhando com políticas nesse sentido


Ainda não é um consenso que as emissões de gases do efeito estufa resultantes das atividades humanas são um dos principais fatores que impulsionam o aquecimento global, e, até por isso, não existem grandes estudos sobre quais seriam os benefícios de cortá-las drasticamente. Tentando acabar com essa lacuna, pesquisadores britânicos e alemães se uniram e chegaram à conclusão de que um maior controle sobre a liberação de gases traria ganhos imensos para a sociedade.
 
Publicado na edição atual do periódico Nature Climate Change, o novo estudoaponta que impor limites severos às emissões poderia evitar entre 20% e 65% dos efeitos negativos das mudanças climáticas até 2100. 

O trabalho, conduzido pela Universidade de Reading em parceria com o Met Office, Tyndall Centre, Instituto Postdam e contando ainda com o apoio de outras universidades, destaca que fazer as emissões atingirem seu máximo já em 2016 - e não em 2030 como sugerem as estimativas atuais - e a partir daí reduzi-las em uma taxa anual de 5% adiaria as piores consequências do aquecimento global e traria grandes benefícios para a produção de alimentos e para o combate a enchentes e secas. 

“É claro que reduzir as emissões não evitará todos impactos das mudanças climáticas, mas nossa pesquisa mostra que essa decisão pode nos comprar tempo para fazer com que as construções, os sistemas de transportes e a agricultura sejam mais resilientes ao aquecimento global”, explicou Nigel Arnell, diretor do Instituto Walker para Pesquisa Climática da Universidade de Reading.

No caso da produção de alimentos, por exemplo, se nada for feito, a cultura mundial do trigo pode ter sua produtividade reduzida em 20% já em 2050. Porém, se os cortes de emissões forem adotados, visando manter o aumento das temperaturas em 2°C, essa queda de produtividade só seria vista em 2100. Assim, teríamos tempo para implementar novas tecnologias que exerçam um papel decisivo para evitar que isso ocorra completamente.

“Cortar as emissões nos dará tempo para nos adaptarmos. Podemos conseguir várias décadas a mais para trabalhar do que teremos se nada for feito. Nosso estudo é bastante otimista nesse sentido, mostrando que se quisermos podemos reduzir de forma significativa os impactos das mudanças climáticas nas pessoas”, completou Arnell.

Ainda segundo o estudo, políticas de redução de emissões evitariam que até 68 milhões de pessoas sofram com a escassez de água já em 2050, e que até 161 milhões saiam do cenário de alto risco de enchentes.

“Podemos evitar muitos dos piores impactos das mudanças climáticas se trabalharmos juntos para manter as emissões baixas. Esta pesquisa nos ajuda a quantificar os benefícios de limitar o aquecimento global em apenas 2°C e mostra como é vital que os países se comprometam nas negociações climáticas da ONU e garantam um acordo com poder de lei até 2015”, afirmou Edward Davey, Secretário de Estado para a Energia e Mudanças Climáticas do Reino Unido.

A pesquisa considera que sem políticas para as emissões, as temperaturas médias subirão entre 4°C a 5°C até o fim do século, colocando quase um bilhão de pessoas em um cenário de pouco acesso à água e 330 milhões sob o risco de inundações.

Acesse o estudo na Nature Climate Change 

Fonte: Instituto CarbonoBrasil

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

ABAIXO ASSINADO - O BRASIL QUER SALVAR O MUSEU DO ÍNDIO.


Esta é uma iniciativa da Defender – Defesa Civil do Patrimônio Histórico com o apoio de Carlos Henrique Rangel (BH/MG) que pretende arrecadar assinaturas em abaixo-assinado que serão encaminhadas a diferentes órgãos do Poder Público visando a defesa de um retalho da história do Brasil.
Foto: http://www.natijuca.com/Acontece/defensoria-da-uniao-e-crea-vistoriam-museu-do-indio-ameacado-pela-copa.html
Excelentíssimo Senhor Sérgio de Oliveira Cabral Santos Filho 
M.D. Governador do Estado do Rio de Janeiro
Excelentíssimo Senhor Sr. Eduardo Paes 
M.D. Prefeito do Município do Rio de Janeiro
Excelentíssimo Senhor Cláudio Soares Lopes 
M.D. Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
Excelentíssimo Senhor Carlos Eduardo Santos Wanderley 
M.D. Defensor Público-Chefe / DPU Rio de Janeiro
Excelentíssima Senhora Cristina Lodi 
M.D. Superintendente do Iphan – Rio de Janeiro
Excelentíssima Senhora Adriana Rattes 
M.D. Secretária de Estado de Cultura – Rio de Janeiro
Com base no Artº 1º do Decreto-Lei nº 25 de 30 de novembro de 1937, que diz: “Constituem o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico”, nós, brasileiros, abaixo assinados, vimos por meio deste requerer à Vossa Excelência que seja suspensa imediatamente de forma liminar, a ordem de demolição do prédio construído em 1862, também conhecido como Museu do Índio.
O Prédio foi residência oficial na época do Império e abrigou o marechal Rondon. Foi sede da Funai e a partir de 1953, e foi transformado pelo antropólogo Darcy Ribeiro em sede do Museu do Índio. 
Em 1978, com a transferência do museu para Botafogo o prédio ficou abandonado. Rogamos que o mesmo seja preservado por sua importância histórica e memória do desenvolvimento social, econômico e cultural do Rio de Janeiro e do Brasil.
É possível através de urbanistas qualificados que esse prédio tão representativo possa ser integrado a nova ambiência urbana que está sendo proposta, inclusive com atividades culturais, educativas e sociais, beneficiando milhares de brasileiros e atraindo turistas interessados.
Ainda, Excelência, lembramos o Artigo 216, da Constituição Federal de 1988, que diz: “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
…V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. 
…§ 1º – O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.” Sem mais.
Os signatários

sábado, 12 de janeiro de 2013

QUATRO MENTIRAS SOBRE O MEIO AMBIENTE.


A civilização que confunde os relógios com o tempo, o crescimento com o desenvolvimento, e o grandalhão com a grandeza, também confunde a natureza com a paisagem


Quatro frases que aumentam o nariz do Pinóquio: 

1- Somos todos culpados pela ruína do planeta.

A saúde do mundo está feito um caco. “Somos todos responsáveis”, clamam as vozes do alarme universal, e a generalização absolve: se somos todos responsáveis, ninguém é. Como coelhos, reproduzem-se os novos tecnocratas do meio ambiente. É a maior taxa de natalidade do mundo: os experts geram experts e mais experts que se ocupam de envolver o tema com o papel celofane da ambiguidade.

Eles fabricam a brumosa linguagem das exortações ao “sacrifício de todos” nas declarações dos governos e nos solenes acordos internacionais que ninguém cumpre. Estas cataratas de palavras – inundação que ameaça se converter em uma catástrofe ecológica comparável ao buraco na camada de ozônio – não se desencadeiam gratuitamente. A linguagem oficial asfixia a realidade para outorgar impunidade à sociedade de consumo, que é imposta como modelo em nome do desenvolvimento, e às grandes empresas que tiram proveito dele. Mas, as estatísticas confessam. 

Os dados ocultos sob o palavreado revelam que 20% da humanidade comete 80% das agressões contra a natureza, crime que os assassinos chamam de suicídio, e é a humanidade inteira que paga as consequências da degradação da terra, da intoxicação do ar, do envenenamento da água, do enlouquecimento do clima e da dilapidação dos recursos naturais não-renováveis. A senhora Harlem Bruntland, que encabeça o governo da Noruega, comprovou recentemente que, se os 7 bilhões de habitantes do planeta consumissem o mesmo que os países desenvolvidos do Ocidente, “faltariam 10 planetas como o nosso para satisfazerem todas as suas necessidades”. Uma experiência impossível.

Mas, os governantes dos países do Sul que prometem o ingresso no Primeiro Mundo, mágico passaporte que nos fará, a todos, ricos e felizes, não deveriam ser só processados por calote. Não estão só pegando em nosso pé, não: esses governantes estão, além disso, cometendo o delito de apologia do crime. Porque este sistema de vida que se oferece como paraíso, fundado na exploração do próximo e na aniquilação da natureza, é o que está fazendo adoecer nosso corpo, está envenenando nossa alma e está deixando-nos sem mundo.

2- É verde aquilo que se pinta de verde.

Agora, os gigantes da indústria química fazem sua publicidade na cor verde, e o Banco Mundial lava sua imagem, repetindo a palavra ecologia em cada página de seus informes e tingindo de verde seus empréstimos. “Nas condições de nossos empréstimos há normas ambientais estritas”, esclarece o presidente da suprema instituição bancária do mundo. Somos todos ecologistas, até que alguma medida concreta limite a liberdade de contaminação.

Quando se aprovou, no Parlamento do Uruguai, uma tímida lei de defesa do meio-ambiente, as empresas que lançam veneno no ar e poluem as águas sacaram, subitamente, da recém-comprada máscara verde e gritaram sua verdade em termos que poderiam ser resumidos assim: “os defensores da natureza são advogados da pobreza, dedicados a sabotarem o desenvolvimento econômico e a espantarem o investimento estrangeiro.”

O Banco Mundial, ao contrário, é o principal promotor da riqueza, do desenvolvimento e do investimento estrangeiro. Talvez, por reunir tantas virtudes, o Banco manipulará, junto à ONU, o recém-criado Fundo para o Meio-Ambiente Mundial. Este imposto à má consciência vai dispor de pouco dinheiro, 100 vezes menos do que haviam pedido os ecologistas, para financiar projetos que não destruam a natureza. Intenção inatacável, conclusão inevitável: se esses projetos requerem um fundo especial, o Banco Mundial está admitindo, de fato, que todos os seus demais projetos fazem um fraco favor ao meio-ambiente.

O Banco se chama Mundial, da mesma forma que o Fundo Monetário se chama Internacional, mas estes irmãos gêmeos vivem, cobram e decidem em Washington. Quem paga, manda, e a numerosa tecnocracia jamais cospe no prato em que come. Sendo, como é, o principal credor do chamado Terceiro Mundo, o Banco Mundial governa nossos escravizados países que, a título de serviço da dívida, pagam a seus credores externos 250 mil dólares por minuto, e lhes impõe sua política econômica, em função do dinheiro que concede ou promete.

A divinização do mercado, que compra cada vez menos e paga cada vez pior, permite abarrotar de mágicas bugigangas as grandes cidades do sul do mundo, drogadas pela religião do consumo, enquanto os campos se esgotam, poluem-se as águas que os alimentam, e uma crosta seca cobre os desertos que antes foram bosques.

3- Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra.

Poder-se-á dizer qualquer coisa de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bondoso Al sempre enviava flores aos velórios de suas vítimas… As empresas gigantes da indústria química, petroleira e automobilística pagaram boa parte dos gastos da Eco-92: a conferência internacional que se ocupou, no Rio de Janeiro, da agonia do planeta. E essa conferência, chamada de Reunião de Cúpula da Terra, não condenou as transnacionais que produzem contaminação e vivem dela, e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno.

No grande baile de máscaras do fim do milênio, até a indústria química se veste de verde. A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo que, para ajudarem a natureza, estão inventando novos cultivos biotecnológicos. Mas, esses desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química, mas sim buscam novas plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas do mundo produtoras de sementes, seis fabricam pesticidas (Sandoz-Ciba-Geigy, Dekalb, Pfizer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas.

A recuperação do planeta ou daquilo que nos sobre dele implica na denúncia da impunidade do dinheiro e da liberdade humana. A ecologia neutra, que mais se parece com a jardinagem, torna-se cúmplice da injustiça de um mundo, onde a comida sadia, a água limpa, o ar puro e o silêncio não são direitos de todos, mas sim privilégios dos poucos que podem pagar por eles. Chico Mendes, trabalhador da borracha, tombou assassinado em fins de 1988, na Amazônia brasileira, por acreditar no que acreditava: que a militância ecológica não pode divorciar-se da luta social. Chico acreditava que a floresta amazônica não será salva enquanto não se fizer uma reforma agrária no Brasil.

Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores rurais morrem assassinados, a cada ano, na luta pela terra, e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão às cidades deixando as plantações do interior. Adaptando as cifras de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas até arrebentarem pela incessante invasão de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem alterar dentro dos limites da ecologia, surda ante o clamor social e cega ante o compromisso político.

4- A natureza está fora de nós.

Em seus 10 mandamentos, Deus esqueceu-se de mencionar a natureza. Entre as ordens que nos enviou do Monte Sinai, o Senhor poderia ter acrescentado, por exemplo: “Honrarás a natureza, da qual tu és parte.” Mas, isso não lhe ocorreu. Há cinco séculos, quando a América foi aprisionada pelo mercado mundial, a civilização invasora confundiu ecologia com idolatria. A comunhão com a natureza era pecado. E merecia castigo.

Segundo as crônicas da Conquista, os índios nômades que usavam cascas para se vestirem jamais esfolavam o tronco inteiro, para não aniquilarem a árvore, e os índios sedentários plantavam cultivos diversos e com períodos de descanso, para não cansarem a terra. A civilização, que vinha impor os devastadores monocultivos de exportação, não podia entender as culturas integradas à natureza, e as confundiu com a vocação demoníaca ou com a ignorância. Para a civilização que diz ser ocidental e cristã, a natureza era uma besta feroz que tinha que ser domada e castigada para que funcionasse como uma máquina, posta a nosso serviço desde sempre e para sempre. A natureza, que era eterna, nos devia escravidão.

Muito recentemente, inteiramo-nos de que a natureza se cansa, como nós, seus filhos, e sabemos que, tal como nós, pode morrer.



Autor: Eduardo Hughes Galeano   -   Fonte: Ponto de Cultura Outras Palavras

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

XERÉM - A IRRESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL DO PODER PÚBLICO.


Em meados de janeiro de 2011 publiquei um artigo sobre a necessidade da responsabilidade socioambiental por parte do poder público como já existe a responsabilidade fiscal, que funciona relativamente bem. Era em função do tsunami que se abateu sobre as cidades serranas de Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis com cerca de 900 mortos e mais de 25 mil desabrigados: gente que perdeu familiares, as casas e pertences.

Passados dois anos, somente agora começou-se a construir algumas casas. Com indignação o digo: houve irresponsabilidade e desumanidade do poder público em vários níveis. Como se trata de gente do povo, a maioria pobre, socialmente, não conta. Seu sofrimento não é sentido e respeitado. Ouvi de políticos a justificativa: “os pobres sabem se defender como sempre, eles se viram, é só esperar.”

Contra esse crime de lesa-humanidade e de total falta de sentido de solidariedade, precisamos nos indignar e protestar. E dá vontade de realizar o que um dia o bispo de 84 anos, muito doente, pastor, profeta e poeta, ameaçado de morte, em São Felix do Araguaia MT sugeriu: deveríamos reunir crianças, poetas e loucos (pois esse Deus ouve) para amaldiçoar os responsáveis pela perpetuação da desgraça das vítimas.

Nestes inícios de janeiro do corrente ano assistimos outro tsunami em Xerém, no município de Caxias, logo no início da estrada que sobre para Petrópolis. A cabeça d’água ocorrida no topo do morro, inundou o pequeno rio, criou uma onda de água, pedra, troncos e lama que arrasou casas, ceifou vidas e deixou centenas de desabrigados. Algo semelhante ocorreu em Angra dos Reis, e em menor escala em Petrópolis.

Mais que o poder político foi um cantor popular e artista Zeca Pagodinho que mantém casa e escola em Xerém que mais mobilizou a solidariedade das pessoas. Sabemos que o poder público só funciona como panela de pressão: só colocado sob pressão permanente, insistindo, cobrando, chateando, incomodando, como a viúva da Bíblia, que ele abandona sua inércia e deixa de usar os álibis da burocracia e começa a fazer alguma coisa. Assim deverá ser feito agora, caso contrário, assistiremos o mesmo drama pelo qual estão passando as cidades serranas.

O acúmulo de desastres socioambientais ocorridos nos últimos tempos, com desabamentos de encostas, enchentes avassaladoras e centenas de vítimas fatais junto com a destruição de inteiras paisagens, nos obrigam a pensar na instauração de uma lei nacional de responsabilidade socioambiental, como existe a lei de responsabilidade social, com pesadas penas para os que não a respeitarem.

Já se deu um passo com a consciência da responsabilidade social das empresas. Elas não podem pensar somente em si mesmas e nos lucros de seus acionistas. Devem assumir uma clara responsabilidade social.

Mas fique claro: responsabilidade social não é a mesma coisa que obrigação social prevista em lei quanto ao pagamento dos impostos, dos encargos e dos salários; nem pode ser confundida com a resposta social que é a capacidade das empresas de criativamente se adequarem às mudanças no campo social, econômico e técnico. A responsabilidade social é a obrigação que as empresas assumem de buscar metas que, a meio e longo prazo, sejam boas para elas e também para o conjunto da sociedade na qual estão inseridas.

Não se trata de fazer para a sociedade o que seria filantropia, mas com a sociedade, se envolvendo nos projetos elaborados em comum com os municípios, ONGs e outras entidades.

Mas sejamos realistas: num regime neoliberal como o nosso, sempre que os negócios não são tão rentáveis, diminui ou até desaparece a responsabilidade social. O maior inimigo da responsabilidade social é o capital especulativo. Seu objetivo é maximizar os lucros das carteiras que controlam. Não veem outra responsabilidade, senão a de garantir ganhos.

Mas a responsabilidade social é insuficiente, pois ela não inclui o ambiental. São poucos os que perceberam a relação do social com o ambiental. Ela é intrínseca. Todas as empresas e cada um de nós vivemos no chão, não nas nuvens: respiramos, comemos, bebemos, pisamos os solos, estamos expostos à mudanças dos climas,mergulhados na natureza com sua biodiversidade, somos habitados por bilhões de bactérias e outros micro-organismos. Quer dizer, estamos dentro da natureza e somos parte dela. Ela pode viver sem nós como o fez por bilhões de anos. Nós não podemos viver sem ela. Portanto, o social sem o ambiental é irreal. Ambos vêm sempre juntos. Esta foi a grande tônica na Cúpula dos Povos no Rio em julho de 2012.

Isso que parece óbvio, não o é para a grande parte das pessoas. Por que tratamos a natureza como externalidade, quer dizer, aquilo não entra no cômputo dos negócios? A razão reside no fato de que somos todos antropocêntricos, isto é: pensamos apenas em nós próprios. A natureza é exterior como se não fôssemos parte dela. Por isso a superexploramos.

Somos irresponsáveis face à natureza quando desmatamos, jogamos bilhões e litros de agrotóxicos no solo; lançamos na atmosfera, anualmente, cerca de 30 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa, contaminamos as águas, destruímos a mata ciliar, não respeitamos o declive das montanhas que podem desmoronar e matar pessoas nem observamos o curso dos rios com as margens que eles precisam, que nas enchentes podem levar tudo de roldão.

Não interiorizamos o fato de que cada ser possui valor intrínseco e por isso têm direitos. Nossa democracia não pode incluir apenas os seres humanos. Sem os outros membros da comunidade de vida, os animais, as plantas, os rios, os micro-organismos do solo, não somos nada. Eles valem como novos cidadãos que devem ser incorporados na nossa compreensão de democracia que então será uma democracia socioambiental. A natureza e as coisas dão-nos sinais. Elas nos chamam atenção para os eventuais riscos que podemos evitar.

Não basta a responsabilidade social, ela deve ser socioambiental. É urgente que o Parlamento cresça em consciência ecológica, desperte para a nova visão da relação homem-natureza-Terra e vote uma lei de responsabilidade socioambiental, imposta a todos os gestores da coisa pública. Só assim evitaremos tragédias e mortes como as ocorridas agora em Xerém, em Petrópolis e Angra dos Reis.

Autor: Leonardo Boff*