sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

CARVÃO DEVE SE TORNAR PRINCIPAL FONTE DE ENERGIA ATÉ 2017, DIZ AIE.



De acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), nos próximos cinco anos o consumo de carvão pode chegar a 4,32 bilhões de toneladas equivalentes de petróleo (btep), contra 4,4 bilhões de btep de petróleo, fazendo com que o recurso se torne a principal fonte de energia do planeta. Esses dados, presentes em um novo relatório da AIE, são preocupantes porque o carvão é ainda mais poluente do que o petróleo, o que significa que as emissões mundiais podem aumentar ainda mais.

“Graças a abundantes recursos e a uma insaciável demanda de eletricidade dos mercados emergentes, o carvão representou cerca da metade do aumento da demanda mundial de energia na primeira década do século 21”, comentou Maria van der Hoeven, diretora da AIE.

“Esse relatório observa que a tendência está continuando. De fato, o mundo queimará cerca de 1,2 bilhão a mais de toneladas de carvão por ano até 2017 comparado a hoje – o equivalente ao consumo de carvão atual da Rússia e dos EUA somados. A cota do carvão nas fontes de energia mundial segue progredindo a cada ano, e se nenhuma mudança for feita nas atuais políticas, o carvão alcançará o petróleo dentro de uma década”, acrescentou ela.

Segundo o relatório, esse aumento no consumo será liderado principalmente pelas grandes economias emergentes, como China e Índia, mas a demanda deve crescer em quase todas as regiões do mundo, exceto nos EUA, onde o gás natural está ganhando espaço.

“A experiência dos EUA sugere que um mercado mais eficiente de gás, marcado pela precificação flexível e alimentado por recursos nativos não convencionais que são produzidos sustentavelmente, pode reduzir o uso de carvão, as emissões de CO2 e as contas de eletricidade dos consumidores sem prejudicar a segurança energética. Europa, China e outras regiões deveriam tomar nota”, observou Hoeven.

A demora no sucesso das tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CCS) também contribui para esse cenário favorável ao carbono, declarou a AIE. “As tecnologias de CCS não estão decolando como se esperava, o que significa que as emissões de CO2 continuarão crescendo substancialmente. Sem o progresso no CCS, e se outros países não puderem replicar a experiência dos EUA e reduzir a demanda de carvão, o carvão corre o risco de ser o grande inimigo em potencial das políticas climáticas”, concluiu a diretora da agência.

Apesar disso, o relatório indica que após 2017 essa tendência tende a se inverter, e os níveis do consumo de carvão devem ficar apenas um pouco acima dos de 2011, devido ao aumento da geração renovável e da desativação de usinas carboníferas antigas.

Subsídios

A opção pelo carvão  se deve em muito por causa dos enormes subsídios que são destinados anualmente para os combustíveis fósseis. Segundo a própria AIE, apenas em 2011 foram US$ 523 bilhões em recursos públicos. Mas já há sinais de que esse tipo de política pode se alterar em breve.

No dia 17 deste mês  os ministros do Meio Ambiente de diversos países da União Europeia, incluindo Alemanha, Itália, Dinamarca e Letônia, recomendaram que os subsídios fornecidos aos combustíveis fósseis devem ser diminuídos para que o bloco possa se desenvolver de maneira mais sustentável.

O painel de ministros apresentou o manifesto Europa Eficiente em Recursos, pedindo que, além do corte nos subsídios, a UE se foque também em investimentos privados, regulação mais eficaz e melhores condições de mercado para produtos duráveis e recicláveis. Até 2013, o painel pretende lançar mais um conjunto de recomendações de políticas de curto prazo.

Mas apesar desse pedido, novas pesquisas mostram que os subsídios continuam grandes, e a participação das fontes fósseis no mix energético mundial continua a crescer.

Dados do centro de pesquisa Chatham House alertam que as principais economias da UE, Alemanha, França, Espanha, Reino Unido e Itália, estão entre os maiores importadores de recursos do mundo, e cada vez mais vulneráveis às flutuações de preço dos combustíveis fósseis, metais e alimentos.

Além disso, informações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que a Alemanha forneceu €7,4 bilhões em subsídios para combustíveis fósseis em 2010, seguida pelo Reino Unido, com € 4,5 bilhões, a Espanha e a França, com €2,6 bilhões, e a Itália, com €1,5 bilhão.

 Autor: Jéssica Lipinski   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

DOCUMENTO "VAZADO" DESTACA EVIDÊNCIAS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.


Apesar de ainda ser um trabalho em andamento, o quinto relatório do IPCC apresenta dados preocupantes e aponta que a concentração de CO2 na atmosfera é a grande responsável pelo aquecimento global


Quando o blog Watts Up With That divulgou, sem autorização, uma cópia do próximo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, sua intenção era enfraquecer a entidade e toda a tese de que o aquecimento do planeta se deve às emissões de gases do efeito estufa resultantes das atividades humanas. 


Foi um tiro no pé. Pois, apesar de o autor do blog, Alec Rawls, se esforçar para destacar alguns pontos que teoricamente dariam suporte para suas próprias teorias contrárias à participação do homem nas mudanças climáticas, uma análise mais calma do relatório mostra justamente o oposto: as evidências de que o clima está se transformando são inequívocas e é extremamente provável que isso seja culpa nossa. 

Segundo o documento, as temperaturas médias globais vêm subindo desde o começo do século XX e esse aquecimento foi particularmente acelerado depois dos anos 1970. Cada uma das últimas três décadas foi significantemente mais quente do que todas as outras desde 1850. 

A temperatura combinada da terra e do mar teria sofrido um aumento de 0,8°C no período de 1901 a 2010 e de cerca de 0,5°C entre 1979 e 2010. 

“Existem evidências consistentes de que há um aumento na rede de energia do sistema terrestre graças a um desequilíbrio. É virtualmente certo que isso é causado por atividades humanas, fundamentalmente pelo aumento das concentrações de dióxido de carbono (CO2)”, afirma o relatório.
O IPCC aponta que o CO2 é a principal causa das mudanças climáticas, muito mais relevante para o aquecimento do que outros fatores naturais. A concentração atual de CO2 na atmosfera é a maior em 800 mil anos. 

O documento identifica também que houve mudanças nos eventos climáticos extremos, mas salienta que o nível de confiança sobre o que mudou varia conforme o tipo de fenômeno e com a região onde ele ocorre.

Para a questão do aumento das chuvas intensas, por exemplo, as estatísticas apontam que existe um crescimento da sua frequência desde 1950. Porém, com relação às secas, é mais difícil observar uma tendência em longo prazo, devido às inconsistências geográficas. 

O relatório registra ainda que os oceanos avançaram entre 2,8 mm e 3,6 mm ao ano desde 1993. A elevação pôde ser acompanhada nos últimos dois séculos, sendo que se acelerou depois de 1900. 

“Desde 1970, o aquecimento e a expansão oceânica e o degelo foram os contribuintes dominantes do aumento do nível do mar, juntos explicando 80% do avanço observado”, afirma o relatório.

A previsão é de que o mar suba entre 0,29 metros e 0,82 metros até 2100. 

O IPCC destaca que é grande a confiança nos modelos climáticos atuais e que eles conseguem simular com precisão os múltiplos cenários previstos. Vários aspectos climáticos, como precipitações em larga escala, comportamento do gelo do Ártico e temperaturas oceânicas, seriam bem representados nessas ferramentas. 

Esse tipo de conclusão é possível graças a simulações realizadas que podem ser comparadas com dados reais. Por exemplo, cientistas conseguem realizar um experimento no qual um modelo recria a flutuação da temperatura terrestre nos últimos 50 anos e depois comparam os resultados com o que se sabe realmente ter acontecido.

“O ponto mais interessante do 'vazamento' do relatório é a revelação do quão grande é o sentimento de negação entre os céticos climáticos. Se eles são capazes de distorcer um documento da forma que fizeram, imagine como são malucas as interpretações que fazem das evidências científicas”, afirmou à rede ABC Steven Sherwood, pesquisador da Universidade de Nova Galês do Sul e membro do IPCC.

Autor: Fabiano Ávila   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

domingo, 23 de dezembro de 2012

REGISTROS NATURAIS CONFIRMAM AQUECIMENTO GLOBAL.

Vídeo: Entenda como foi realizado o estudo Aquecimento Global um Registro Independente dos Últimos 130 Anos / NOAA


Diversos institutos de pesquisa climática, universidades e órgãos governamentais realizam a mensuração diária das temperaturas e mesmo com esses dados sendo semelhantes e apontando o aquecimento do planeta no último século, muitos ainda desconfiam dos números apresentados. Essas pessoas alegam, por exemplo, que as estações de medição estão localizadas em centros urbanos, assim, o aquecimento encontrado seria apenas um reflexo do efeito estufa local.

O recém-publicado estudo“Aquecimento Global: um Registro Independente dos Últimos 130 Anos”, presente na última edição do periódico Geophysical Research Letters (necessário ter cadastro para acessar), ajuda a acabar com esse tipo de dúvida ao constatar que diversos registros naturais demonstram que podemos confiar nas medições.     

Realizado por uma equipe de pesquisadores da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA) e das universidades da Carolina do Sul, Colorado e de Berna, na Suíça, o trabalho analisou dados coletados em núcleos de gelo, corais antigos, cavernas e camadas de sedimentos em lagos e oceanos e chegou à conclusão de que o mesmo aquecimento apontado pelas medições é também vislumbrado na natureza.

“Observando somente elementos paleoclimáticos, é possível concluir que a tendência de aquecimento da superfície global é confirmada por evidências independentes. Estamos convencidos de que nos últimos 130 anos houve sem dúvidas um aumento das temperaturas”, declarou David Anderson, chefe do setor de paleoclimatologia do NOAA e principal autor do estudo.

Para chegar a esse resultado, os pesquisadores analisaram 173 conjuntos de dados que refletem mudanças nas temperaturas entre 1730 a 1995. Para garantir que o estudo fosse realmente independente de instrumentos, foram utilizados apenas dados “brutos” dos registros naturais, sem a usual reconstrução de temperaturas, processo que obrigatoriamente passa por medições com termômetros.

O crescimento dos corais, a presença de conchas em sedimentos e até o comportamento geológico de cavernas, tudo isso é impactado por mudanças nas temperaturas. Assim, é possível, por exemplo, acompanhar as taxas de isótopos de oxigênio em esqueletos de corais para se medir a variação climática.

“A correlação entre os dados paleoclimáticos e o registro de temperaturas possui implicações essenciais para a ciência climática e destaca a importância das pesquisas paleoclimáticas. Trabalhos como esse aumentam nosso entendimento do clima global ao estender nosso conhecimento de uma forma independente e objetiva”, disse Thomas Karl, diretor do Centro de Dados Climáticos do NOAA.

O estudo destacou ainda que os registros naturais demonstram que o aquecimento global nos últimos 15 anos avaliados (1980 a 1995) foi significantemente mais rápido do que a tendência de longo prazo (1880 a 1995).

Novembro de 2012

Agora que podemos ter mais confiança nos termômetros, assustam ainda mais os dados divulgados nesta semana pelo próprio NOAA.

Segundo a mais recente atualização do State of the Climate, novembro de 2012 foi o 333° mês consecutivo no qual as temperaturas globais ficaram acima da média para o último século. Além disso, foi o quinto novembro mais quente desde 1880.

A temperatura média terrestre em novembro ficou 1,13°C acima da média do século XX e a dos oceanos, 0,5°C. 

Para o período entre janeiro e novembro, foi registrada uma temperatura 0,96°C acima da média histórica, fazendo deste período o quinto mais quente desde que começaram as medições. 

Os dados do NOAA são coerentes com os apresentados pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) há algumas semanas, que apontavam uma temperatura média de 14,45°C em 2012, quase meio grau acima da média entre 1961 e 1990.

Se seguir neste ritmo, 2012 deve ser o nono ano mais quente da história, mesmo sofrendo forte influência do fenômeno La Niña, que provoca a queda das temperaturas.

Autor: Fabiano Ávila   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

RIO DE JANEIRO AVANÇANDO EM 2 RODAS.



Os ciclistas que circulam pelos caminhos traçados para esta finalidade na orla marítima do Rio de Janeiro superam os motoristas, presos em longos engarrafamentos. Uma solução simples, não contaminante e barata que agora as autoridades cariocas estimulam como uma das saídas para o crescente trânsito urbano. A cena, cada vez mais comum no Rio por causa do crescimento econômico, o crédito fácil e a venda estimulada de carros, revelou novos problemas.

“Vendi meu carro porque tinha problemas para estacionar, os estacionamentos são caros, não aguentava mais o trânsito, estressei”, conta à IPS a professora de educação física Teresa Moreira, que agora vai de bicicleta para o trabalho. “Quando dirigia, ficava estressada e era mal-educada. Agora, com a bicicleta, não”, comemora a ciclista que diariamente viaja pela avenida costeira, entre os bairros de Leme e Leblon, na zona sul da cidade.

Os nós de trânsito acontecem em qualquer parte da cidade e sem hora estabelecida. Pioram com cada fato imprevisto: um acidente, a visita de um presidente ou de um astro de rock, um grande evento internacional ou apenas um dia de compras para o Natal.

“Se no começo o foco era a implantação de ciclovias para lazer, hoje buscamos prioritariamente incentivar o uso da bicicleta como meio de transporte para médias e curtas distâncias e alimentar o sistema de transporte de massa”, explica à IPS a gerente do programa Rio Capital da Bicicleta, da Secretaria de Meio Ambiente do município, Maria Lúcia Navarro.

O Rio de Janeiro é a segunda cidade mais povoada do Brasil depois de São Paulo, com 11,8 milhões de habitantes incluindo sua área metropolitana. No final da década de 1980, começaram a ser implantadas vias especiais que hoje cobrem cerca de 300 quilômetros entre ciclovias, rotas especiais demarcadas nas ruas e faixas compartilhadas com pedestres nas alamedas.

Esse avanço colocou a cidade no primeiro lugar nacional em quilômetros para bicicletas, e no segundo da América do Sul, depois de Bogotá. A bicicleta não emite poluentes nem gases que aquecem a atmosfera, assegura rapidez nos percursos, tem baixo custo e beneficia a saúde “porque pedalar é um exercício aeróbico”, afirma Navarro.

Se a rede de ciclovias se integrar a um transporte público de qualidade, “sua eficiência se estenderá a toda a cidade”, disse à IPS  Zé Lobo, diretor presidente da Transporte Ativo, uma organização não governamental que promove formas alternativas de locomoção.

O interesse da prefeitura foi destacado na nomeação de Carlos Roberto de Figueiredo Osório, ex-secretário de Conservação, à frente da Secretaria de Transportes, segundo Clarisse Cunha Linke, vice-diretora do escritório brasileiro do Instituto de Políticas para o Transporte e o Desenvolvimento (IPTD). Por isto, são esperadas mais políticas de incentivo às bicicletas. Navarro assegura que se avançará em relação aos últimos 20 anos. Hoje, cerca de 4% das viagens de curta e média distâncias (cerca de um milhão de viagens diárias) são feitas de bicicleta. Seus usuários já superam os do trem e das barcas.

O plano municipal 2009-2012 definiu a importância da mobilidade urbana sustentável e, neste contexto, a conservação e ampliação do sistema cicloviário, integrando-o aos demais, a implantação de locais para guardar e alugar bicicletas em vários pontos. Para o período 2013-2016, a previsão é que sejam construídos 150 quilômetros de ciclovias, além de bicicletários (estacionamentos para bicicletas), para chegar a 2016, ano dos Jogos Olímpicos nesta cidade, com uma rede de 450 quilômetros.

A rede de ciclovias “ainda está muito desconectada do sistema de transportes”, explicou Linke à IPS. “É preciso pensar como integrar os meios de massa, metrô, trem, vias expressas de ônibus, os pontos de serviços, os bicicletários”, acrescentou, lembrando que “se deve começar a pensar a bicicleta não só como lazer mas como meio de transporte”. Para atingir essa meta, Navarro se refere a planos de implantar ônibus de trânsito rápido (OTR) com bicicletários em suas estações e com espaço nos veículos para as bicicletas, com planos para expandir esses veículos a zonas de alta densidade demográfica, como a região oeste da cidade.

O IPTD colabora com o governo em assessoramento técnico e estuda com outras organizações um sistema de bicicletas vinculado ao centro da cidade. “Os estabelecimentos comerciais, por exemplo, ainda não veem a bicicleta como algo que pode ajudá-los a ter mais clientela. É importante a iniciativa privada começar a participar mais”, destacou Linke. Esta especialista afirmou também que se deve distribuir melhor as ciclovias na trama urbana, pois a maior parte se concentra na faixa costeira.

Para Linke, “se alguém iniciar a viagem de bicicleta e terminar de bicicleta, se conseguirá melhorar o sistema”. Moreira aprova medidas já implantadas, como poder levar a bicicleta no metrô nos finais de semana. Mas, “durante a semana, o metrô já está lotado. Imagine se todos decidirem também colocar bicicletas nos vagões”.

O setor privado participa com 600 bicicletas compartilhadas que são alugadas principalmente nas áreas turísticas. Para Linke, este sistema deveria ser mais estimulado. O novo plano de transporte contempla um processo de licitação para instalar 200 estações e duas mil bicicletas em áreas menos privilegiadas e mais isoladas. Também é preciso ampliar os lugares de estacionamentos. “Seria necessário atender mais a qualidade total da infraestrutura e não somente sua extensão”, afirmou Zé Lobo.

Solange Medeiros, estudante de direito que usa a bicicleta como esporte, considera importante inculcar respeito entre ciclistas e pedestres. “Às vezes, os pedestres caminham pelas ciclovias, e isso causa problemas e perigo de acidentes”, disse à IPS. Moreira propõe que as autoridades promovam campanhas de trânsito, inclusive para quem anda de bicicleta elétrica que “circulam a 40 quilômetros por hora, acima do permitido, e atropelam idosos”, criticou. Como em tudo, e para evitar o estresse do qual fugiu vendendo o automóvel, “o importante é o respeito”, enfatizou.

Autor: Fabiana Frayssinet   -   Fonte: IPS

AS CHUVAS CHEGARAM. COMO ESTAMOS??


Adentramos no sul-sudeste brasileiro o período chuvoso crítico que anualmente tem marcado a região por terríveis tragédias associadas a enchentes e deslizamentos. Como decorrência do impacto político causado pelas últimas tragédias foram, a partir da administração pública em seus diversos níveis, tomadas uma série de medidas sob a intenção de reduzir a vulnerabilidade das populações mais ameaçadas por esses conhecidos fenômenos. A pergunta automaticamente se coloca: estamos hoje melhor preparados, as medidas adotadas estão em um rumo correto?
 
Sem dúvida melhoramos em alguns quesitos: maior consciência sobre a gravidade do problema, aumento dos conhecimentos científicos e tecnológicos associados à questão, maior envolvimento de órgãos técnicos e gerenciais para a temática áreas de risco, mobilização de um maior número de pesquisadores, profissionais em geologia, geotecnia e meteorologia, técnicos e militantes de sistemas de Defesa Civil, organização de sistemáticas de alertas pluviométricos, mapeamento de áreas de risco críticas, etc.
 
Ressalte-se no âmbito desses dados positivos a nova e avançada legislação brasileira para a gestão de riscos consignada na Lei Federal 12.608. No entanto, é forçoso reconhecer que ainda serão extremamente pequenos os ganhos reais práticos em maior segurança para as populações mais ameaçadas. Prevalecem ainda grandes deficiências associadas à falta de linhas de comando e uma melhor articulação entre os diversos órgãos envolvidos, à dificuldade da efetiva integração das prefeituras municipais nos programas de segurança propostos, à resistência e à irresponsabilidade com que a administração pública tem lidado com a radical necessidade de remoção/reassentamento das famílias que ocupam áreas de muito alto risco, à tendência de acomodamento geral às medidas de alerta pluviométrico, em uma atitude cruel e desumana que pressupõe que a gestão de riscos possa se resumir a tocar sirenes e botar a população a correr de suas casas nos momentos mais críticos.
 
A continuarem preponderantes a omissão e/ou a insuficiência e/ou a impropriedade das ações públicas no tratamento dos gravíssimos problemas associados à ocorrência de enchentes e deslizamentos de encostas não há dúvida, as tragédias tenderão a se ampliar em sua intensidade, frequência e letalidade. Consequência direta da criminosa indecisão em se tomar, dentro de uma abordagem de cunho preventivo, onde se inserem destacadamente o planejamento urbano e os programas habitacionais, a elementar decisão de, no mínimo, parar de cometer os erros essenciais que estão na origem desses graves fenômenos.
 
Em outras palavras, nossas cidades continuam a crescer, sob os olhos e complacência da administração pública em seus diversos níveis, praticando os mesmos erros e incongruências técnicas que as conduziram a esse grau de calamidade pública; no caso das enchentes impermeabilizando o solo, promovendo uma excessiva canalização de rios e córregos, expondo por terraplenagem o solo à erosão com decorrente assoreamento dos cursos d’água; no caso dos deslizamentos e solapamentos de margens, ou ocupando encostas e fundos de vale que jamais deveriam ser ocupados dada sua já alta instabilidade natural, ou ocupando com técnicas as mais inadequadas terrenos até potencialmente urbanizáveis.


Autor: Álvaro Rodrigues dos Santos   -   Fonte: Jornal da Ciência

domingo, 16 de dezembro de 2012

COMO CONSTRUIR UMA NOVA SOCIEDADE DA ABUNDÂNCIA??


Vivemos em uma sociedade do crescimento. Isto é, em uma sociedade dominada por uma economia que tende a se deixar absorver pelo crescimento como fim em si mesmo, objetivo primordial, senão único, da vida. Justamente por isso a sociedade do consumo é o resultado óbvio de um mundo baseado em uma tripla  ausência de limites: na produção e, portanto, na extração dos recursos renováveis e não renováveis, na criação de necessidades – e, portanto, de produtos supérfluos e resíduos – e na emissão de lixo e poluição (do ar, da terra e da água).

O coração antropológico da sociedade do crescimento torna-se então a dependência dos seus membros ao consumo. O fenômeno é explicado de um lado com a própria lógica do sistema e, de outro, com um instrumento privilegiado da colonização no imaginário, a publicidade. E encontra uma explicação psicológica no jogo da necessidade e do desejo.

Para usar uma metáfora, tornamo-nos "toxicodependentes" do crescimento. Que tem muitas formas, já que a bulimia da compra – somos todos "turboconsumidores" – corresponde ao workaholism, a dependência do trabalho.

Um mecanismo que tende a produzir infelicidade porque se baseia na criação contínua de desejo. Mas o desejo, ao contrário das necessidades, não conhece a saciedade. Pois se dirige a um objeto perdido e inencontrável, dizem os psicanalistas. Sem poder encontrar o "significado perdido", ele se fixa sobre o poder, a riqueza, o sexo ou o amor, todas coisas cuja sede não conhece limites. (...)

Até por isso é preciso imaginar um novo modelo. Econômico e existencial. Assim, a redefinição da felicidade como "abundância frugal em uma sociedade solidária" corresponde à força de ruptura do projeto do decrescimento. Ela pressupõe que se saia do círculo infernal da criação ilimitada de necessidades e produtos, e da crescente frustração que ele gera, e de modo complementar de temperar o egoísmo resultante de um individualismo de massa.

Sair da sociedade de consumo é, portanto, uma necessidade, mas o projeto iconoclasta de construir uma sociedade de "abundância frugal" só pode suscitar objeções e confrontar-se com formas de resistência, independentemente dos cursos e dos percursos do decrescimento. Acima de tudo, nos perguntarão, a própria expressão "abundância frugal" não é talvez um oxímoro pior do que aquele justamente denunciado do "desenvolvimento sustentável"?

Pode-se no máximo conceber e aceitar uma "prosperidade sem crescimento", segundo a proposta do ex-conselheiro para o meio ambiente do governo trabalhista, Tim Jackson, mas uma abundância na frugalidade é realmente demais! Na verdade, enquanto permanecermos encerrados no imaginário do crescimento, só poderemos ver nisso uma insuportável provocação.

De outro lado, ao contrário, se sairmos de certas lógicas, pode ficar claro que a frugalidade é uma condição preliminar com relação a toda forma de abundância. A abundância consumista pretende gerar felicidade através da satisfação dos desejos de todos, mas isso depende de rendas distribuídas de modo desigual e, portanto, sempre insuficientes para permitir que a imensa maioria cubra as despesas básicas necessárias, principalmente quando o patrimônio natural foi dilapidado.

Indo ao oposto dessa lógica, a sociedade do decrescimento se propõe a gerar a felicidade da humanidade através da autolimitação para poder alcançar a "abundância frugal".

Como toda sociedade humana, uma sociedade do decrescimento certamente deverá organizar a produção da sua vida, isto é, utilizar de modo razoável os recursos do seu ambiente e consumi-los através dos bens materiais e dos serviços. Mas fará isso um pouco como aquelas "sociedades da abundância" descrita pelos antropólogo Marshall Salhins, que ignoram a lógica viciosa da raridade das necessidades, do cálculo econômico. Esses fundamentos imaginários da instituição da economia devem ser postos em discussão.

Jean Baudrillard havia visto isso muito bem em seu tempo, quando disse que "uma das contradições do crescimento é que, ao mesmo tempo, ele produz bens e necessidades, mas não os produz no mesmo ritmo". O resultado é o que ele chama de uma "pauperização psicológica", um estado de insatisfação generalizada, que define, ele afirma, "a sociedade do crescimento como o contrário de uma sociedade da abundância". A verdadeira pobreza está, de fato, na perda da autonomia e na dependência.

Um provérbio dos nativos norte-americanos explica bem o conceito: "Ser dependente significa ser pobre; ser independente significa aceitar não enriquecer". Sejamos, portanto, pobres, ou mais exatamente miseráveis, nós que somos prisioneiros de tantas próteses. A frugalidade reencontrada permite precisamente que se reconstrua uma sociedade da abundância, com base no que Ivan Illich chamava de "subsistência moderna". Ou seja, "o modo de viver em uma economia pós-industrial, dentro da qual as pessoas são capazes de reduzir a sua dependência do mercado e chegaram a isso protegendo – através de instrumentos políticos – uma infraestrutura em que as técnicas e os instrumentos servem, em primeiro lugar, pra criar valores de uso não quantificados e não quantificáveis por parte dos fabricantes de necessidades profissionais".

O crescimento do bem-estar, portanto, é a via mestra do decrescimento, porque, sendo felizes, somos menos suscetíveis à propaganda e à compulsividade do desejo.

Muitas dessas opções implicam uma mudança da nossa atitude, também com relação à natureza. Ainda me lembro da minha primeira laranja, encontrada na minha meia no Natal, no fim da guerra. Também me lembro, alguns anos mais tarde, dos pimeiros cubos de gelo que um vizinho rico que tinha uma geladeira nos trazia nas noites de verão e que nós mordíamos com prazer como se fossem guloseimas. Uma falsa abundância comercial destruiu a nossa capacidade de nos maravilharmos diante dos dons da natureza (ou da engenhosidade humana que transforma esses dons). Reencontrar essa capacidade suscetível de desenvolver uma atitude de fidelidade e de reconhecimento com relação à mãe Terra, ou mesmo uma certa nostalgia é a condição de sucesso do projeto de construção de uma sociedade do decrescimento sereno, assim como a condição necessária para evitar o destino funesto de uma obsolescência programada da humanidade.



Autor: Serge Latouche   -   Fonte: IHU Online

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

DERRETIMENTO DE GELO POLAR TRIPLICA EM 20 ANOS.



Quando se trata do derretimento do gelo polar, sempre houve pesquisas contraditórias sobre a intensidade do degelo e se ele realmente estava ocorrendo, o que servia de combustível para os céticos climáticos refutarem o aquecimento global. Mas um novo estudo promete acabar com essa dúvida, e afirma que a perda de gelo vem acelerando nos últimos anos.

Segundo a pesquisa, levando em consideração todas as alterações na massa de gelo da Antártida e da Groenlândia, os polos têm perdido gelo, e a uma velocidade três vezes maior do que antes de 1992. Os cálculos mostram que, nos últimos 20 anos, quatro trilhões de toneladas de gelo foram perdidas.

Apesar de certas áreas da Antártida estarem ganhando gelo, no geral a massa perdida pelos dois polos é pelo menos duas vezes maior do que a massa ganha. “Podemos dizer definitivamente que tanto a Groenlândia com a Antártida estão perdendo massa, e à medida que a temperatura sobe vamos perder mais gelo”, afirmou Andrew Shepherd, da Universidade de Leeds.

Esse derretimento mais intenso está contribuindo cada vez mais para o aumento do nível dos oceanos, que nas últimas duas décadas subiu 11 mm. Pra se ter uma ideia, antes de 1992 o degelo contribuía com cerca de 20% do aumento do nível do mar; agora, esse índice subiu para aproximadamente 40%.

Outros fatores que contribuem para a elevação do mar são a expansão da água causada pelas temperaturas mais quentes e o derretimento de mantos de gelo ou geleiras fora dos polos, como as que fazem partes de cordilheiras.

“As estimativas são as mais confiáveis até agora, e acabam com 20 anos de incertezas sobre as mudanças na massa de gelo na Antártida e Groenlândia. Houve 30 estimativas diferentes da contribuição no aumento do nível do mar, oscilando de um aumento anual de dois mm a uma queda de 0,4 mm”, comentou Shepherd.

“As mudanças climáticas provavelmente acelerarão muito a perda de gelo. Na Groenlândia, estamos vendo perdas realmente dramáticas no gelo, mas ainda é incerto se elas diminuirão, ficarão iguais ou acelerarão mais”, acrescentou Ian Joughin, da Universidade de Washington.

De acordo com os cientistas, mesmo uma pequena mudança no nível do mar pode ser uma ameaça para áreas baixas, principalmente durante a ocorrência de desastres naturais. “Áreas baixas precisam considerar a infraestrutura agora. Londres terá que construir uma nova barreira contra enchentes no próximo século. Levaria 30 anos pra construir, então o planejamento precisa começar logo”, observou Shepherd.

Por isso, os pesquisadores enfatizaram a importância do estudo e como ele poderá contribuir para o entendimento da influência das mudanças climáticas no nível dos oceanos e para a prevenção de acidentes.

“Esse projeto é uma realização espetacular. Os dados apoiarão testes essenciais de modelos preditivos, e levarão a um melhor entendimento de como as mudanças no nível do mar podem depender de decisões humanas que influenciam as temperaturas globais”, concluiu Richard Alley, da Universidade Estadual da Pensilvânia, que não estava envolvido na pesquisa.

Fonte: Instituto CarbonoBrasil