Intitulado
"Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, Contra a
Mercantilização da Vida e em Defesa dos Bens Comuns", o texto final da
Cúpula dos Povos foi divulgado nesta sexta-feira (22) e afirma que muitos
governos demonstraram irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do
planeta e promoveram os interesses das corporações na conferência Rio+20.
O documento defende a urgente distribuição de riqueza e da renda, o combate ao
racismo e ao etnocídio, a garantia do direito a terra e território, o direito à
cidade, ao meio ambiente e à água, à educação, a cultura, a liberdade de
expressão e democratização dos meios de comunicação, e à saúde sexual e
reprodutiva das mulheres.
Leia o texto na íntegra:
Declaração final:
Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, contra a
mercantilização da vida e em defesa dos bens comuns.
Movimentos sociais e populares, sindicatos, povos e organizações da sociedade
civil de todo o mundo presentes na Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça
Social e Ambiental vivenciaram nos acampamentos, nas mobilizações massivas e
nos debates a construção das convergências e alternativas, conscientes de que
somos sujeitos de uma outra relação entre humanos e humanas e entre a
humanidade e a natureza, assumindo o desafio urgente de frear a nova fase de
recomposição do capitalismo e de construir, através de nossas lutas, novos
paradigmas de sociedade.
A Cúpula dos Povos é o momento simbólico de um novo ciclo na trajetória de
lutas globais que produz novas convergências entre movimentos de mulheres,
indígenas, negros, juventudes, agricultores(as) familiares e camponeses,
trabalhadores(as), povos e comunidades tradicionais, quilombolas, lutadores
pelo direito à cidade e religiões de todo o mundo. As assembleias, mobilizações
e a grande Marcha dos Povos foram os momentos de expressão máxima dessas
convergências.
As instituições financeiras multilaterais, as coalizões a serviço do sistema
financeiro, como o G8/G20, a captura corporativa da ONU e a maioria dos
governos demonstraram irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do
planeta e promoveram os interesses das corporações na conferência Rio+20
oficial. Em constraste a isso, a vitalidade e a força das mobilizações e dos
debates na Cúpula dos Povos fortaleceram a nossa convicção de que só o povo
organizado e mobilizado pode libertar o mundo do controle das corporações e do
capital financeiro.
Há vinte anos, o Fórum Global, também realizado no Aterro do Flamengo,
denunciou os riscos que a humanidade e a natureza corriam com a privatização e
o neoliberalismo. Hoje afirmamos que, além de confirmar nossa análise,
ocorreram retrocessos significativos em relação aos direitos humanos já
reconhecidos. A Rio+20 repete o falido roteiro de falsas soluções defendidas
pelos mesmos atores que provocaram a crise global. À medida que essa crise se
aprofunda, mais as corporações avançam contra os direitos dos povos, a
democracia e a natureza, sequestrando os bens comuns da humanidade para salvar
o sistema economico-financeiro.
As múltiplas vozes e forças que convergem em torno da Cúpula dos Povos
denunciam a verdadeira causa estrutural da crise global: o sistema capitalista
associado ao patriarcado, ao racismo e à homofobia.
As corporações transnacionais continuam cometendo seus crimes com a sistemática
violação dos direitos dos povos e da natureza com total impunidade. Da mesma
forma, avançam seus interesses através da militarização, da criminalização dos
modos de vida dos povos e dos movimentos sociais promovendo a
desterritorialização no campo e na cidade.
Avança sobre os territórios e os ombros dos trabalhadores(as) do sul e do
norte. Existe uma dívida ambiental histórica que afeta majoritariamente os
povos do sul do mundo que deve ser assumida pelos países altamente
industrializados que causaram a atual crise do planeta.
O capitalismo também leva à perda do controle social, democrático e comunitario
sobre os recursos naturais e serviços estratégicos, que continuam sendo privatizados,
convertendo direitos em mercadorias e limitando o acesso dos povos aos bens e
serviços necessários à sobrevivência.
A atual fase financeira do capitalismo se expressa através da chamada economia
verde e de velhos e novos mecanismos, tais como o aprofundamento do
endividamento público-privado, o super-estímulo ao consumo, a apropriação e
concentração das novas tecnologias, os mercados de carbono e biodiversidade, a
grilagem e estrangeirização de terras e as parcerias público-privadas, entre
outros.
As alternativas estão em nossos povos, nossa história, nossos costumes,
conhecimentos, práticas e sistemas produtivos, que devemos manter, revalorizar
e ganhar escala como projeto contra-hegemônico e transformador.
A defesa dos espaços públicos nas cidades, com gestão democrática e
participação popular, a economía cooperativa e solidária, a soberania
alimentar, um novo paradigma de produção, distribuição e consumo, a mudança da
matriz energética, são exemplos de alternativas reais frente ao atual
sistema agro-urbano-industrial.
A defesa dos bens comuns passa pela garantia de uma série de direitos humanos e
da natureza, pela solidariedade e respeito às cosmovisões e crenças dos
diferentes povos, como, por exemplo, a defesa do “Bem Viver” como forma de existir
em harmonia com a natureza, o que pressupõe uma transição justa a ser
construída com os trabalhadores(as) e povos. A construção da transição justa
supõe a liberdade de organização e o direito a contratação coletiva e políticas
públicas que garantam formas de empregos decentes.
Reafirmamos a urgência da distribuição de riqueza e da renda, do combate ao
racismo e ao etnocídio, da garantia do direito a terra e território, do direito
à cidade, ao meio ambiente e à água, à educação, a cultura, a liberdade de
expressão e democratização dos meios de comunicação, e à saúde sexual e
reprodutiva das mulheres.
O fortalecimento de diversas economias locais e dos direitos territoriais
garantem a construção comunitária de economias mais vibrantes. Estas economias locais
proporcionam meios de vida sustentáveis locais, a solidariedade comunitária,
componentes vitais da resiliência dos ecossistemas. A maior riqueza é a
diversidade da natureza e sua diversidade cultural associada e as que estão
intimamente relacionadas.
Os povos querem determinar para que e para quem se destinam os bens comuns e
energéticos, além de assumir o controle popular e democrático de sua produção.
Um novo modelo enérgico está baseado em energias renováveis descentralizadas e
que garanta energia para a população e não para corporações.
A transformação social exige convergências de ações, articulações e agendas
comuns a partir das resistências e proposições necessárias que estamos
disputando em todos os cantos do planeta. A Cúpula dos Povos na Rio+20 nos
encoraja para seguir em frente nas nossas lutas.
Rio de Janeiro, 15 a22 de junho de 2012.
Comitê Facilitador da Sociedade Civil na Rio+20 – Cúpula dos Povos